quinta-feira, 24 de setembro de 2015

‘Fui muito arrogante durante a minha carreira’, diz Pierre Onássis de volta com Afrodisíaco
Foto: Estela Marques / Bahia Notícias
Após sete anos afastado do axé, Pierre Onássis remonta o Afrodisíaco. Exatamente. O cantor, que em 2008 se tornou evangélico e passou a ser intérprete de música gospel, conta que, neste período, percebeu muita coisa que não levava em conta para a sua carreira musical. “Eu me arrependo de ter sido áspero e, talvez, em algum momento grosseiro como artista. Eu acho que fui muito arrogante durante a minha carreira musical. Eu só vim perceber isso quando me converti”, contou ele. Pierre falou também sobre inimigos, relação com Jau, carnaval, e novos rumos para a banda. “Nosso desejo não é só trazer o Afrodisíaco, mas fortalecer o movimento afro-baiano e brasileiro”, enfatiza. 

Como surgiu a possibilidade de voltar com o Afrodisíaco?
Na verdade, a música afro e a música baiana nunca deixaram de existir dentro de mim, né? Passei algum tempo circulando na música gospel, porque me converti, e o que eu sei fazer é cantar. Tanto que, quis cantar a música gospel. Mas esse movimento sempre esteve dentro de mim, até durante essa época, levei a levada, levei a percussão, levei essa rítmica baiana, porque está no DNA. Desde o Olodum, meu histórico é percussivo. O que me fez retornar foi o convite. A observação de alguns empresários que existe uma lacuna dentro deste universo baiano, que precisava ser preenchida, já que o próprio Afrodisíaco não durou muito tempo – não sei se você se lembra, ele mudou pra ‘Vixe Mainha’, por conta da questão do nome. Então depois que eu saí, o movimento continuou com o ‘Vixe Mainha’ e com Jau, depois ele saiu. O nome ficou adormecido, porque não tínhamos a patente, que era de outra pessoa. Quando surgiu a oportunidade de termos o nome, depois do convite desses empresários para que retomássemos o movimento afro, falaram: ‘E aí, vamos voltar?’ e eu topei. Eles me convenceram e, como eu já gosto, né? Não sou esse religioso, porque a religião não salva ninguém. Eu sou músico, brasileiro, baiano. A música é ponte, não é muralha. Eu continuo com as minhas intenções e pensamentos religiosos, voltados para a igreja, mas entendo que a música me faz circular por todo o universo. E aí, a gente foi pesquisar o nome e percebemos a possibilidade de usar o nome, registramos e, agora sim, somos detentores oficiais do nome e da marca Afrodisíaco. Agora temos a liberdade de fazermos o que quisemos.

São os mesmo músicos? Como funcionará essa nova fase?
Alguns músicos são os mesmos, trouxe uns três ou quatro. Mas o importante é a essência. Eu não podia trazer, de novo, o movimento percussivo se não tivesse a verdade que tinha antes. Então, eu trouxe a verdade, na ritmia, na personalidade musical, nos repertórios, nas releituras... Exemplo, se a gente relembrar ‘Mama África’, ‘Flor do Desejo’. Nós tomamos posse dessas músicas, as pessoas diziam que eram músicas do Afrodisíaco. ‘Mama África’ deixou de ser de Chico Cézar para ser do Afrodisíaco, assim como ‘Flor do Desejo’ deixou de ser do Pepeu Gomes para ser nossa. Então a gente traz esse desejo de continuar o movimento e, talvez até, unificar, trazer o Muzenza, o Ilê, o Olodum, Seu Jorge, Margareth. Fortalecer o movimento. Nosso desejo não é só trazer o Afrodisíaco, mas fortalecer o movimento afro-baiano e brasileiro. Nós temos uma música rica, e que está sendo pouco explorada, na verdade. Nesses últimos anos a música deixou de ser explorada. Abrimos o leque pra várias vertentes musicais no carnaval. Eu fiquei sete anos afastado, mas sempre observando as coisas acontecerem, o sertanejo entrou e tá dominando. Eu não participava, sempre viajava pra fazer meus retiros, mas ficava observando, porque sempre gostei, fui admirador. Compus algumas músicas, inclusive. Acho que a gente volta do saudosismo do Afrodisíaco e, ao mesmo tempo, trazemos músicas novas, inéditas. Mas o perfil é aquele: percussão, audiovisual, cênico, raiz. E nada melhor do que levar para o Pelourinho, como tudo começou.

Dessa vez você estará sozinho, não terá segunda voz?
Nós temos duas negras lindas que vão fazer o backing. Nós não tínhamos isso antes, né? Também é como um preenchimento, porque a gente então substitui ninguém, né? Não posso trazer ninguém pra substituir Jau, o artista é insubstituível porque ele tem a personalidade dele. Então, o que a gente traz é a marca, o Afrodisíaco, a responsabilidade desse nome, da identidade musical. Vamos trazer o simples, o mais difícil é fazer o simples, né? E sem esquecer a linguagem popular, o Afrodisíaco é uma banda popular. É uma banda simples. Não tem porque rebuscar, se não você foge do povo. Eu sou povo, desde o Olodum eu fui povo. Bom balanço fui povo. ‘Juliana’ é povo, ‘Entra na Roda’ é povo. Então, essas mulheres trazem esse glamour da beleza negra, da suavidade da voz. Adriana, que é ‘Dani’ e Paloma. Temos também o violino, que é um instrumento extremamente inusitado para o universo percussivo, trazemos ele de novo. Acho que o que vai chamar a atenção das pessoas é a música nova. A gente tem um disco que vai ser lançado nessa segunda-feira, um promocional, que é um show ao vivo, no estúdio. Que você vai se sentir como se estivesse no ensaio, entendeu? São 16 canções com sucessos antigos e novos, na verdade, 70% são novas. Trazemos músicas de outros artistas também, a gente faz uma mistura com originalidade.

Você volta pro axé no meio da crise. Qual o diferencial para voltar e não se incluir no mais do mesmo?
A gente já sentiu, na própria parceria com os empresários, a preocupação deles de não ter a mesma facilidade financeira de antes. A crise afetou todo mundo, não é só a música baiana. Então a gente vai se adequar. Fazer o que gosta de fazer, amar o que faz, se adaptar e levar a vida. Creio que os obstáculos que estão aí pra mim, pra você, pra todo mundo, tendem a ser superados. E a música tem essa mágica de nos impulsionar, de quebrar paradigmas, de dar vontade de viver. Tem uma música no nosso repertório que chama ‘Agora’ e que diz assim: ‘A vida passa ligeiro, anda, vem. O dia acordou esperando você, vem ver. Olha que mar, olha que vento, olha o relógio está passando tempo. O que tinha pra fazer depois, é agora. O que tinha pra dizer depois, diga agora. Ame mais, beije mais. Abrace mais, queira mais, viva!’ É um despertar pra vida. Viver intensamente, ainda que na crise. Não só o Afrodisíaco está passando pelas dificuldades, mas os tops estão passando pela mesma realidade. Aquele que fazia 50, não está fazendo mais, ninguém tem mais dinheiro pra bancar tanto show por aí. Então, a gente vai se adequar. O ensaio do pelourinho é uma fase de readaptação, é despertar nas pessoas o interesse pelo Afrodisíaco. Vamos encontrar e procurar, é claro, caminhos que ainda não foram utilizados. Vão acontecer toda sexta até o carnaval, no Quincas Berros D’Água.

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